O Brasil de Lula é um país mais desigual
A propaganda do governo e de grande parte da imprensa sobre um país mais justo e igualitário, turbinado pelos recentes anos de crescimento, aumenta todos os dias. Nessa versão revisitada do velho slogan da ditadura, “pra frente Brasil”, o país estaria caminhando a passos largos rumo ao desenvolvimento, ao fim do desemprego e a extinção da pobreza. Conduzidos por um governo de acordo entre as classes sociais, estaríamos, enfim, à beira de ser um “país de classe média”.
O Brasil de verdade, infelizmente, está tão distante dessa imagem quanto a novela das 20h está da realidade da grande maioria da população. No Brasil real, os salários continuam baixos, o desemprego alto e a desigualdade, longe de estar diminuindo, cresce cada vez mais, aprofundando um abismo histórico entre ricos e pobres. Alguns dados divulgados dão a dimensão do verdadeiro retrato de um país que não aparece na televisão.
Um país de desiguais
No dia 8 de setembro o IBGE divulgou os dados da Pnad 2009, a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios. A pesquisa traz informações como o nível de emprego e renda do ano passado e está servindo para embasar a ideia de que a desigualdade vem diminuindo. Mas será isso mesmo que está ocorrendo? Para entender a construção desse argumento, temos que analisar alguns números do IBGE.
O primeiro elemento que salta aos olhos é o aumento do desemprego entre 2008 e 2009, reflexo da crise financeira internacional que pegou em cheio o país. De acordo com a pesquisa, o número de desempregados aumentou 1,3 milhão, passando de 7,1 milhões para 8,4, um crescimento de mais de 18% da população desocupada. Ainda que parte desse estrago tenha sido revertida nos últimos meses de 2009 e no primeiro semestre deste ano, ele indica o grau de vulnerabilidade do país em relação às crises. Reafirma ainda a noção de que a primeira vítima de qualquer baque na economia é sempre o emprego.
Mas se o número de desempregados cresceu nesse período, pelo menos a desigualdade diminuiu, certo? Nem tanto. Segundo a Pnad, o rendimento médio do trabalhador assalariado cresceu 2,2% entre 2008 e 2009. Passou de R$ 1.082 para R$ 1.111. Junto a isso, a pesquisa traz um indicativo chamado “índice de Gini”, que mediria a desigualdade entre os rendimentos. Quanto mais perto de 1, mais desigual é a renda. Tal índice teria passado de 0,521 para 0,518 no ano passado. Uma redução irrelevante. Pior, uma redução muito pequena entre os próprios assalariados.
O que o governo e a grande maioria das análises omitem é que a Pnad, ao ser uma pesquisa domiciliar, capta somente o rendimento dos assalariados. Ou seja, ao pensarmos no ridículo da cena de um banqueiro abrindo a porta de sua casa para um pesquisador do IBGE e declarando sua renda, deduz-se que essa faixa, muito reduzida fica de fora de qualquer tipo de pesquisa. O que está ocorrendo de 2004 para cá é, na verdade, uma diminuição da desigualdade entre quem vive do salário, não entre os trabalhadores e os realmente ricos, ou seja, os grandes banqueiros e empresários.
Isso porque não há como medir a renda real da burguesia. É para isso, entre outras coisas, que serve o sigilo fiscal. E, mesmo que fosse possível acessar esses dados, expedientes como a sonegação encobriria os seus reais ganhos. Mas analisando rapidamente o aumento dos lucros dos banqueiros no último período, dá para se ter uma ideia da discrepância entre os salários e os lucros. Entre 2008 e 2009, o lucro dos oito maiores bancos privados teve crescimento de 24%, segundo a agência de riscos Austin Rating. Ou seja, enquanto a média dos salários cresceu 2,2%, o lucro dos maiores bancos teve um salto de 24%, 10 vezes mais.
Monopólio dos recordes
A cada ano, os grandes bancos têm lucros recordes. No primeiro semestre deste ano, os seis maiores bancos lucraram juntos nada menos que R$ 21 bilhões. O Bradesco, por exemplo, teve os melhores seis meses de sua história, com R$ 4,5 bi a mais nos seus caixas. O Itaú também bateu seu próprio recorde, lucrando R$ 6,4 bi no período. Já o mesmo não pode ser dito dos salários. Mesmo tendo um relativo crescimento nos últimos anos, a média salarial é menor do que em 1996, quando era o equivalente hoje a R$ 1.144. Isso significa que não só a média salarial é apenas a metade do que deveria ser um salário mínimo de acordo com o Dieese, como também mostra que os trabalhadores estão mais pobres hoje do que estavam no governo FHC.
Isso significa que os últimos anos de crescimento econômico, apesar de ter se refletido numa pequena melhora nos índices de desemprego e renda, não foi capaz de elevar esses índices acima dos observados na década de 1990. É a expressão de uma política econômica que desviou, só em 2009, cerca de R$ 380 bilhões do Orçamento para banqueiros através dos juros da dívida pública. Mais de 30 vezes o montante gasto com o Bolsa Família. Com a diferença de que, enquanto o programa social vai para 12 milhões de famílias, no máximo apenas 20 mil famílias se beneficiam com esses juros.
Famílias Endividadas
O que sustentaria a alta popularidade do governo? Entre fatores como a identificação da figura de Lula com a classe operária e o atrelamento de direções do movimento sindical, o acesso ao crédito nos últimos anos deu a falsa sensação de um aumento da renda. É possível hoje parcelar um automóvel em 60 vezes. Mas os salários, como vimos, não aumentaram significativamente.
Esse fenômeno está provocando um grave endividamento das famílias. Pesquisa recente do Ipea revela que 54% das famílias brasileiras estão endividadas. O mais surpreendente é que, dessas, mais de 74% declararam que não pagarão todas as suas dívidas. Ou seja, o aumento do consumo está se dando à custa do endividamento, não é reflexo do aumento da renda. Na próxima onda da crise econômica, isso vai potencializar os seus efeitos e, mais uma vez, os mais prejudicados serão os mais pobres.
Tudo como antes
Assim como aconteceu nos anos do chamado “milagre econômico”, de 1967 a 1973, em plena ditadura militar, o crescimento econômico se dá à custa do aumento da desigualdade. Apesar das migalhas sobrarem para a classe trabalhadora, nenhuma mudança estrutural ocorreu. A diferença é que, enquanto naquela época o país crescia a taxas de 12% ao ano, agora não chega à metade disso.
Será que o slogan de “pra frente Brasil” estaria, assim, anunciando uma repetição da História, mas agora como farsa?
Um país de desiguais
No dia 8 de setembro o IBGE divulgou os dados da Pnad 2009, a Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios. A pesquisa traz informações como o nível de emprego e renda do ano passado e está servindo para embasar a ideia de que a desigualdade vem diminuindo. Mas será isso mesmo que está ocorrendo? Para entender a construção desse argumento, temos que analisar alguns números do IBGE.
O primeiro elemento que salta aos olhos é o aumento do desemprego entre 2008 e 2009, reflexo da crise financeira internacional que pegou em cheio o país. De acordo com a pesquisa, o número de desempregados aumentou 1,3 milhão, passando de 7,1 milhões para 8,4, um crescimento de mais de 18% da população desocupada. Ainda que parte desse estrago tenha sido revertida nos últimos meses de 2009 e no primeiro semestre deste ano, ele indica o grau de vulnerabilidade do país em relação às crises. Reafirma ainda a noção de que a primeira vítima de qualquer baque na economia é sempre o emprego.
Mas se o número de desempregados cresceu nesse período, pelo menos a desigualdade diminuiu, certo? Nem tanto. Segundo a Pnad, o rendimento médio do trabalhador assalariado cresceu 2,2% entre 2008 e 2009. Passou de R$ 1.082 para R$ 1.111. Junto a isso, a pesquisa traz um indicativo chamado “índice de Gini”, que mediria a desigualdade entre os rendimentos. Quanto mais perto de 1, mais desigual é a renda. Tal índice teria passado de 0,521 para 0,518 no ano passado. Uma redução irrelevante. Pior, uma redução muito pequena entre os próprios assalariados.
O que o governo e a grande maioria das análises omitem é que a Pnad, ao ser uma pesquisa domiciliar, capta somente o rendimento dos assalariados. Ou seja, ao pensarmos no ridículo da cena de um banqueiro abrindo a porta de sua casa para um pesquisador do IBGE e declarando sua renda, deduz-se que essa faixa, muito reduzida fica de fora de qualquer tipo de pesquisa. O que está ocorrendo de 2004 para cá é, na verdade, uma diminuição da desigualdade entre quem vive do salário, não entre os trabalhadores e os realmente ricos, ou seja, os grandes banqueiros e empresários.
Isso porque não há como medir a renda real da burguesia. É para isso, entre outras coisas, que serve o sigilo fiscal. E, mesmo que fosse possível acessar esses dados, expedientes como a sonegação encobriria os seus reais ganhos. Mas analisando rapidamente o aumento dos lucros dos banqueiros no último período, dá para se ter uma ideia da discrepância entre os salários e os lucros. Entre 2008 e 2009, o lucro dos oito maiores bancos privados teve crescimento de 24%, segundo a agência de riscos Austin Rating. Ou seja, enquanto a média dos salários cresceu 2,2%, o lucro dos maiores bancos teve um salto de 24%, 10 vezes mais.
Monopólio dos recordes
A cada ano, os grandes bancos têm lucros recordes. No primeiro semestre deste ano, os seis maiores bancos lucraram juntos nada menos que R$ 21 bilhões. O Bradesco, por exemplo, teve os melhores seis meses de sua história, com R$ 4,5 bi a mais nos seus caixas. O Itaú também bateu seu próprio recorde, lucrando R$ 6,4 bi no período. Já o mesmo não pode ser dito dos salários. Mesmo tendo um relativo crescimento nos últimos anos, a média salarial é menor do que em 1996, quando era o equivalente hoje a R$ 1.144. Isso significa que não só a média salarial é apenas a metade do que deveria ser um salário mínimo de acordo com o Dieese, como também mostra que os trabalhadores estão mais pobres hoje do que estavam no governo FHC.
Isso significa que os últimos anos de crescimento econômico, apesar de ter se refletido numa pequena melhora nos índices de desemprego e renda, não foi capaz de elevar esses índices acima dos observados na década de 1990. É a expressão de uma política econômica que desviou, só em 2009, cerca de R$ 380 bilhões do Orçamento para banqueiros através dos juros da dívida pública. Mais de 30 vezes o montante gasto com o Bolsa Família. Com a diferença de que, enquanto o programa social vai para 12 milhões de famílias, no máximo apenas 20 mil famílias se beneficiam com esses juros.
Famílias Endividadas
O que sustentaria a alta popularidade do governo? Entre fatores como a identificação da figura de Lula com a classe operária e o atrelamento de direções do movimento sindical, o acesso ao crédito nos últimos anos deu a falsa sensação de um aumento da renda. É possível hoje parcelar um automóvel em 60 vezes. Mas os salários, como vimos, não aumentaram significativamente.
Esse fenômeno está provocando um grave endividamento das famílias. Pesquisa recente do Ipea revela que 54% das famílias brasileiras estão endividadas. O mais surpreendente é que, dessas, mais de 74% declararam que não pagarão todas as suas dívidas. Ou seja, o aumento do consumo está se dando à custa do endividamento, não é reflexo do aumento da renda. Na próxima onda da crise econômica, isso vai potencializar os seus efeitos e, mais uma vez, os mais prejudicados serão os mais pobres.
Tudo como antes
Assim como aconteceu nos anos do chamado “milagre econômico”, de 1967 a 1973, em plena ditadura militar, o crescimento econômico se dá à custa do aumento da desigualdade. Apesar das migalhas sobrarem para a classe trabalhadora, nenhuma mudança estrutural ocorreu. A diferença é que, enquanto naquela época o país crescia a taxas de 12% ao ano, agora não chega à metade disso.
Será que o slogan de “pra frente Brasil” estaria, assim, anunciando uma repetição da História, mas agora como farsa?
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