A saúde pública no RN: À espera de um milagre?
A saúde pública do Rio Grande do Norte vive a maior crise de sua história. Pacientes nos corredores, entubados sem sedativos, desabastecimento completo de remédios e materiais básicos. No maior hospital do estado, todos os dias morrem oito pessoas em média por falta de atendimento adequado
É difícil descrever a situação da saúde pública do Rio Grande do Norte. Entretanto, se fosse possível resumi-la numa só palavra, esta seria “desumana”. A atual crise nos hospitais do estado não possui precedentes nos últimos vinte anos. Há um caos generalizado no setor, com a ausência de leitos, medicamentos e insumos em níveis altíssimos. A maioria dos pacientes está em macas nos corredores, esperando vagas de UTI'’s e sem tratamento digno. Por todas as unidades de saúde, é comum a falta de esparadrapos, sabão e reagentes para exames laboratoriais, por exemplo. Em Natal, no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, pacientes são entubados nos corredores, sem sedativos. E esta é apenas uma amostra dos graves problemas vividos pela população pobre na busca por atendimento médico.
No dia 4 de julho deste ano, a governadora Rosalba Ciarlini (DEM) decretou situação de calamidade na saúde pública do Rio Grande do Norte, prometendo solucionar a crise de desabastecimento. Mais de dois meses depois, nada mudou nos hospitais do estado. Pelo menos não para melhor. A cada dia que passa, a situação se agrava ainda mais e uma certeza vai se consolidando: a de que o “Plano de Enfrentamento para os Serviços de Urgência e Emergência do RN”, anunciado pelo governo como a salvação da lavoura, não saiu do discurso. Pior: o decreto de calamidade está servindo apenas para suspender férias e licenças-prêmios dos servidores. O drama da saúde pública, na verdade, tem mostrado o completo desrespeito da governadora Rosalba pela vida da população.
No dia 4 de julho deste ano, a governadora Rosalba Ciarlini (DEM) decretou situação de calamidade na saúde pública do Rio Grande do Norte, prometendo solucionar a crise de desabastecimento. Mais de dois meses depois, nada mudou nos hospitais do estado. Pelo menos não para melhor. A cada dia que passa, a situação se agrava ainda mais e uma certeza vai se consolidando: a de que o “Plano de Enfrentamento para os Serviços de Urgência e Emergência do RN”, anunciado pelo governo como a salvação da lavoura, não saiu do discurso. Pior: o decreto de calamidade está servindo apenas para suspender férias e licenças-prêmios dos servidores. O drama da saúde pública, na verdade, tem mostrado o completo desrespeito da governadora Rosalba pela vida da população.
Mas o completo abandono da saúde pública vai além da capital. Em Mossoró, no interior do estado, o número de leitos nos hospitais da segunda maior cidade do estado é baixíssimo e não atende as necessidades do município e cidades vizinhas. As unidades de saúde não ficam atrás e sofrem com o desabastecimento de medicamentos. “Faltam remédios, profissionais e muitos leitos. As pessoas reclamam da demora no atendimento. Muitas só conseguem marcar exames após um ou dois anos de espera. A governadora Rosalba é a própria calamidade”, comentou João Morais, diretor do Sindsaúde de Mossoró.
Cenário de guerra
O quadro caótico do Hospital Walfredo Gurgel, o maior do Rio Grande do Norte em urgência e emergência, se tornou mais do que insuportável desde o último dia 12, quarta-feira. Revoltados, enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos, servidores e acompanhantes de pacientes decidiram paralisar as atividades com um protesto em frente à unidade hospitalar. “A Copa não tem pressa, saúde é o que interessa!” , gritavam os manifestantes, referindo-se aos altos investimentos feitos para obras do Mundial de Futebol. Por mais de uma hora, centenas de pessoas ficaram aglomeradas na porta do hospital.
Muitos quiseram sair e participar da manifestação, mas foram impedidos pela equipe médica. Num ato de desespero, reflexo de quem não tem mais nada a perder, alguns deles até ameaçaram colocar fogo nos colchões. O dia do protesto coincidiu com a visita realizada pelo Conselho Regional de Medicina (Cremern), que convidou conselheiros dos Direitos Humanos no RN para verificar a realidade do hospital. Com os próprios olhos, eles puderam ver um cenário visto apenas em lugares que vivem os horrores de uma guerra.
Deitado numa maca na porta do Centro Cirúrgico, um paciente que se recuperava de uma cirurgia no baço tinha como apoio para sua cabeça a tampa de um tambor de lixo. Eletrocardiogramas eram feitos no meio dos corredores. Pacientes aguardavam cirurgias ortopédicas há mais de um mês, sem previsão para fazer os procedimentos.
Numa das cenas mais terríveis do protesto, a dona de casa Maria de Fátima da Silva se ajoelhou pedindo piedade e atendimento para seu irmão, que há 20 dias esperava por uma cirurgia ortopédica. “Piedade, pelo amor de Deus. São vidas que estão aqui dentro e precisam de respeito. É uma vergonha faltar sabão para limpar os instrumentos, quanto mais medicamentos. Enquanto isso, meu irmão está numa maca dura, sem lençol, nessa espera sem fim. Quantas pessoas vão precisar morrer para que resolvam essa situação? ”, questionou a dona de casa, em depoimento ao Jornal de Hoje.
Com mais de 20 anos de trabalho no Hospital Walfredo Gurgel, a técnica de enfermagem do setor de ortopedia, Ângela Maria, esteve à frente do protesto contra o descaso na saúde. “Paramos porque não temos a menor condição de funcionamento. A insatisfação é geral. Queremos apenas respeito profissional e condições dignas de trabalho, pois faltam materiais básicos, e alguns dos que temos estão vencidos. É uma situação muito triste, de impotência profissional e queremos apenas respeito, por nós e pelos pacientes que sofrem com essa situação”, afirmou.
Cenário de guerra
O quadro caótico do Hospital Walfredo Gurgel, o maior do Rio Grande do Norte em urgência e emergência, se tornou mais do que insuportável desde o último dia 12, quarta-feira. Revoltados, enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos, servidores e acompanhantes de pacientes decidiram paralisar as atividades com um protesto em frente à unidade hospitalar. “A Copa não tem pressa, saúde é o que interessa!” , gritavam os manifestantes, referindo-se aos altos investimentos feitos para obras do Mundial de Futebol. Por mais de uma hora, centenas de pessoas ficaram aglomeradas na porta do hospital.
Muitos quiseram sair e participar da manifestação, mas foram impedidos pela equipe médica. Num ato de desespero, reflexo de quem não tem mais nada a perder, alguns deles até ameaçaram colocar fogo nos colchões. O dia do protesto coincidiu com a visita realizada pelo Conselho Regional de Medicina (Cremern), que convidou conselheiros dos Direitos Humanos no RN para verificar a realidade do hospital. Com os próprios olhos, eles puderam ver um cenário visto apenas em lugares que vivem os horrores de uma guerra.
Deitado numa maca na porta do Centro Cirúrgico, um paciente que se recuperava de uma cirurgia no baço tinha como apoio para sua cabeça a tampa de um tambor de lixo. Eletrocardiogramas eram feitos no meio dos corredores. Pacientes aguardavam cirurgias ortopédicas há mais de um mês, sem previsão para fazer os procedimentos.
Numa das cenas mais terríveis do protesto, a dona de casa Maria de Fátima da Silva se ajoelhou pedindo piedade e atendimento para seu irmão, que há 20 dias esperava por uma cirurgia ortopédica. “Piedade, pelo amor de Deus. São vidas que estão aqui dentro e precisam de respeito. É uma vergonha faltar sabão para limpar os instrumentos, quanto mais medicamentos. Enquanto isso, meu irmão está numa maca dura, sem lençol, nessa espera sem fim. Quantas pessoas vão precisar morrer para que resolvam essa situação? ”, questionou a dona de casa, em depoimento ao Jornal de Hoje.
Com mais de 20 anos de trabalho no Hospital Walfredo Gurgel, a técnica de enfermagem do setor de ortopedia, Ângela Maria, esteve à frente do protesto contra o descaso na saúde. “Paramos porque não temos a menor condição de funcionamento. A insatisfação é geral. Queremos apenas respeito profissional e condições dignas de trabalho, pois faltam materiais básicos, e alguns dos que temos estão vencidos. É uma situação muito triste, de impotência profissional e queremos apenas respeito, por nós e pelos pacientes que sofrem com essa situação”, afirmou.
Intervenção federal
Neste dia 18, enquanto profissionais da saúde faziam outro protesto, uma nova visita foi feita ao Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel. Desta vez, pela Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Havia 120 pacientes instalados nos corredores e uma fila de 90 pessoas esperando por cirurgia ortopédica. Segundo plantonistas do hospital, a média diária de óbitos saltou de 2 para 8 nos últimos dias. Chocados com a realidade, os representantes das entidades anunciaram, em reunião com a governadora Rosalba Ciarlini, que vão denunciar o governo à Organização dos Estados Americanos (OEA) e à Organização das Nações Unidas (ONU) por violação dos Direitos Humanos. O CFM também vai pedir uma intervenção federal na saúde do RN. Um relatório será enviado ao Ministério da Saúde.
Para piorar, os serviços municipais de saúde também vão de mal a pior e agravam a situação dos hospitais. Sem pagamento há 4 meses, os médicos cooperados paralisaram suas atividades nos pronto-atendimentos e nas maternidades de Natal. Em resposta, a prefeita Micarla de Sousa (PV) fechou dois pronto-atendimentos e uma maternidade. “Agora, a população está completamente desassistida e morrendo sem atendimento. Cesarianas foram suspensas e as mulheres entram em trabalho de parto sentadas nos corredores. No Hospital Santa Catarina, a superlotação da maternidade não permite nem que as pacientes possam sentar”, revelou a enfermeira Simone Dutra e diretora do Sindsaúde de São Gonçalo do Amarante.
Como se não bastasse o abandono, a Prefeitura de Natal e o governo do estado ainda promovem uma ampla terceirização dos serviços de saúde, passando para as mãos de Organizações Sociais (empresas privadas) os recursos públicos e o controle dos hospitais e unidades de saúde. Essa modalidade de privatização transforma a saúde pública em um grande negócio e é um dos gargalos da corrupção, como mostrou a Operação Assepsia, que apontou fraudes na contratação de organizações sociais em Natal e prendeu o ex-secretário de saúde do município.
Onde estão os recursos da saúde?
Os representantes da Fenam e do CFM também criticaram a falta de investimentos em saúde no Estado. De acordo com Aloízio Tibiriçá, 2º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina, em 2011 o Ministério da Saúde repassou R$ 850 milhões para o Rio Grande do Norte, mas apenas metade da verba foi investida na saúde. Além disso, segundo o Tribunal de Contas do Estado, o governo do RN investiu 35% menos em saúde do que em publicidade no ano passado. O Portal da Transparência diz mais ainda. Em 18 meses, ou seja, até junho deste ano, a governadora Rosalba Ciarlini teve uma receita superior a R$ 12 bilhões. Uma média de R$ 700 milhões por mês ou R$ 23 milhões por dia. Mesmo assim, os recursos não chegam aos hospitais, onde as pessoas agonizam esperando por atendimento.
Entretanto, o governo Dilma Rousseff também tem responsabilidade nesse caos, já que a saúde pública sofre problemas semelhantes em todo o país. Os recursos investidos pelo governo federal estão longe do mínimo necessário. Em 2012, 47% do orçamento da União irá para o pagamento de juros da dívida pública aos banqueiros nacionais e internacionais. A saúde vai receber até o fim do ano menos de 4%. Para completar, o ministro da fazendo, Guido Mantega, anunciou um corte de R$ 5 bilhões nos recursos da saúde. Desse modo, é fácil perceber as causas do abandono criminoso da vida nos hospitais do Brasil.
A privatização e o baixo financiamento da saúde estão acabando com o SUS. É necessário um sistema 100% público e estatal. O Brasil precisa duplicar os gastos com saúde, chegando a pelo menos 6% do PIB (Produto Interno Bruto). Toda verba pública deve ser gasta apenas em saúde dentro do sistema estatal. Todos os hospitais e demais equipamentos precisam ser estatizados.
Neste dia 18, enquanto profissionais da saúde faziam outro protesto, uma nova visita foi feita ao Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel. Desta vez, pela Federação Nacional dos Médicos (Fenam) e pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Havia 120 pacientes instalados nos corredores e uma fila de 90 pessoas esperando por cirurgia ortopédica. Segundo plantonistas do hospital, a média diária de óbitos saltou de 2 para 8 nos últimos dias. Chocados com a realidade, os representantes das entidades anunciaram, em reunião com a governadora Rosalba Ciarlini, que vão denunciar o governo à Organização dos Estados Americanos (OEA) e à Organização das Nações Unidas (ONU) por violação dos Direitos Humanos. O CFM também vai pedir uma intervenção federal na saúde do RN. Um relatório será enviado ao Ministério da Saúde.
Para piorar, os serviços municipais de saúde também vão de mal a pior e agravam a situação dos hospitais. Sem pagamento há 4 meses, os médicos cooperados paralisaram suas atividades nos pronto-atendimentos e nas maternidades de Natal. Em resposta, a prefeita Micarla de Sousa (PV) fechou dois pronto-atendimentos e uma maternidade. “Agora, a população está completamente desassistida e morrendo sem atendimento. Cesarianas foram suspensas e as mulheres entram em trabalho de parto sentadas nos corredores. No Hospital Santa Catarina, a superlotação da maternidade não permite nem que as pacientes possam sentar”, revelou a enfermeira Simone Dutra e diretora do Sindsaúde de São Gonçalo do Amarante.
Como se não bastasse o abandono, a Prefeitura de Natal e o governo do estado ainda promovem uma ampla terceirização dos serviços de saúde, passando para as mãos de Organizações Sociais (empresas privadas) os recursos públicos e o controle dos hospitais e unidades de saúde. Essa modalidade de privatização transforma a saúde pública em um grande negócio e é um dos gargalos da corrupção, como mostrou a Operação Assepsia, que apontou fraudes na contratação de organizações sociais em Natal e prendeu o ex-secretário de saúde do município.
Onde estão os recursos da saúde?
Os representantes da Fenam e do CFM também criticaram a falta de investimentos em saúde no Estado. De acordo com Aloízio Tibiriçá, 2º vice-presidente do Conselho Federal de Medicina, em 2011 o Ministério da Saúde repassou R$ 850 milhões para o Rio Grande do Norte, mas apenas metade da verba foi investida na saúde. Além disso, segundo o Tribunal de Contas do Estado, o governo do RN investiu 35% menos em saúde do que em publicidade no ano passado. O Portal da Transparência diz mais ainda. Em 18 meses, ou seja, até junho deste ano, a governadora Rosalba Ciarlini teve uma receita superior a R$ 12 bilhões. Uma média de R$ 700 milhões por mês ou R$ 23 milhões por dia. Mesmo assim, os recursos não chegam aos hospitais, onde as pessoas agonizam esperando por atendimento.
Entretanto, o governo Dilma Rousseff também tem responsabilidade nesse caos, já que a saúde pública sofre problemas semelhantes em todo o país. Os recursos investidos pelo governo federal estão longe do mínimo necessário. Em 2012, 47% do orçamento da União irá para o pagamento de juros da dívida pública aos banqueiros nacionais e internacionais. A saúde vai receber até o fim do ano menos de 4%. Para completar, o ministro da fazendo, Guido Mantega, anunciou um corte de R$ 5 bilhões nos recursos da saúde. Desse modo, é fácil perceber as causas do abandono criminoso da vida nos hospitais do Brasil.
A privatização e o baixo financiamento da saúde estão acabando com o SUS. É necessário um sistema 100% público e estatal. O Brasil precisa duplicar os gastos com saúde, chegando a pelo menos 6% do PIB (Produto Interno Bruto). Toda verba pública deve ser gasta apenas em saúde dentro do sistema estatal. Todos os hospitais e demais equipamentos precisam ser estatizados.
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